segunda-feira, 15 de junho de 2015

CRÔNICAS

Crônica contemporânea
Crônica é um gênero textual ligado ao cotidiano, são textos curtos, onde o autor  se utiliza de suas impressões ao redor de um fato, é uma narrativa informal, intimista, que utiliza um certo lirismo, e que geralmente está ligado ao humor ou reflexão. Os autores consagrados permanecem, e os estilos e temas são os mais diferenciados, onde cada autor busca extrair de um simples fato corriqueiro, o máximo de humor ou reflexão.
No Brasil, temos uma lista de autores espetaculares, com seus estilos diferenciados e sua maneira simples de brincar com as palavras, são alguns destes: Rubem Braga, Paulo Mendes Campos, Fernando Sabino, Manuel Bandeira e Sérgio Porto (Stanislaw Ponte Preta). Abaixo iremos citar o estilo e trajetória de alguns destes e um de seus textos.
Manuel Bandeira (1886-1968)
Manuel Bandeira foi cronista e poeta, os temas de suas crônicas variam de personalidades a arquitetura, sem falar da parte cultural e artística. O autor demonstra sensibilidade ao escrever sobre a vida cotidiana, sobre a vida pública e as novidades da época. Além disso, sua vida particular se abria em seus textos, falava de seus sentimentos, como as saudades, alegrias e tristezas, isso demonstra o lado intimista da crônica.
Namorados

O rapaz chegou-se para junto da moça e disse:
-Antônia, ainda não me acostumei com o seu corpo, com sua cara.
A moça olhou de lado e esperou.
-Você não sabe quando a gente é criança e de repente vê uma lagarta listrada?
A moça se lembrava:
-A gente fica olhando...
A meninice brincou de novo nos olhos dela.
O rapaz prosseguiu com muita doçura:
-Antônia, você parece uma lagarta listrada.
A moça arregalou os olhos, fez exclamações.
O rapaz concluiu:
-Antônia, você é engraçada! Você parece louca.

Luis Fernando Verissimo (1936-)
Este autor seguiu a trajetória de seu pai, Erico Verissimo, foi reconhecido por publicar suas crônicas nos jornais mais famosos do Brasil e por publicar mais de 50 livros. Além de cronista, é dramaturgo, romancista, tradutor, cartunista e músico. Em suas crônicas ele analisava a sociedade brasileira a seu modo, o que gerava uma certa ironia e humor, ele expunha todas as deficiências da sociedade e além disso, causava humor por expor fatos improváveis e que aparentavam ser insignificantes.
APRENDA A CHAMAR A POLÍCIA
Eu tenho o sono muito leve, e numa noite dessas notei que havia alguém andando sorrateiramente no quintal de casa. Levantei em silêncio e fiquei acompanhando os leves ruídos que vinham lá de fora, até ver uma silhueta passando pela janela do banheiro. Como minha casa era muito segura, com grades nas janelas e trancas internas nas portas, não fiquei muito preocupado, mas era claro que eu não ia deixar um ladrão ali, espiando tranqüilamente.
Liguei baixinho para a polícia, informei a situação e o meu endereço.
Perguntaram-me se o ladrão estava armado ou se já estava no interior da casa.
Esclareci que não e disseram-me que não havia nenhuma viatura por perto para ajudar, mas que iriam mandar alguém assim que fosse possível.
Um minuto depois, liguei de novo e disse com a voz calma:
— Oi, eu liguei há pouco porque tinha alguém no meu quintal. Não precisa mais ter pressa. Eu já matei o ladrão com um tiro da escopeta calibre 12, que tenho guardada em casa para estas situações. O tiro fez um estrago danado no cara!
Passados menos de três minutos, estavam na minha rua cinco carros da polícia, um helicóptero, uma unidade do resgate , uma equipe de TV e a turma dos direitos humanos, que não perderiam isso por nada neste mundo.
Eles prenderam o ladrão em flagrante, que ficava olhando tudo com cara de assombrado. Talvez ele estivesse pensando que aquela era a casa do Comandante da Polícia.
No meio do tumulto, um tenente se aproximou de mim e disse:
— Pensei que tivesse dito que tinha matado o ladrão.
Eu respondi:
— Pensei que tivesse dito que não havia ninguém disponível.
Luis Fernando Verissimo

Sérgio Porto (Stanislaw Ponte Preta, 1923-1968)
Sérgio Porto, mais conhecido por seu pseudônimo: Stanislaw Ponte Preta, não era só cronista, era também músico e radialista. Ficou famoso por deixar sua marca nos jornais, que eram o tom satírico e suas críticas. Ele morreu muito jovem, aos 45 anos, porém deixou como legado diversas crônicas, como a “A velhinha contrabandista” que é uma das mais lidas da literatura brasileira.
A VELHA CONTRABANDISTA
Diz que era uma velhinha que sabia andar de lambreta. Todo dia ela passava pela fronteira montada na lambreta, com um bruto saco atrás da lambreta. O pessoal da Alfândega - tudo malandro velho - começou a desconfiar da velhinha...

Um dia, quando ela vinha na lambreta com o saco atrás, o fiscal da Alfândega mandou ela parar. A velhinha parou e então o fiscal perguntou assim pra ela:

- Escuta aqui, vovozinha, a senhora passa por aqui todo dia, com esse saco aí atrás. Que diabo a senhora leva nesse saco?

A velhinha sorriu com os poucos dentes que lhe restavam e mais outros, que ela adquirira no odontólogo, e respondeu: 

- É areia!

Aí quem sorriu foi o fiscal. Achou que não era areia nenhuma e mandou a velhinha saltar da lambreta para examinar o saco. A velhinha saltou, o fiscal esvaziou o saco e dentro só tinha areia. Muito encabulado, ordenou à velhinha que fosse em frente. Ela montou na lambreta e foi embora, com o saco de areia atrás.

Mas o fiscal continuava desconfiado...
Talvez a velhinha passasse um dia com areia e no outro com muamba, dentro daquele maldito saco. No dia seguinte, quando ela passou na lambreta com o saco atrás, o fiscal mandou parar outra vez. Perguntou o que é que ela levava no saco e ela respondeu que era areia, uai! O fiscal examinou e era mesmo. Durante um mês seguido o fiscal interceptou a velhinha e, todas às vezes, o que ela levava no saco era areia.

Diz que foi aí que o fiscal se chateou:

- Olha, vovozinha, eu sou fiscal de alfândega com 40 anos de serviço. Manjo essa coisa de contrabando pra burro. Ninguém me tira da cabeça que a senhora é contrabandista.

- Mas no saco só tem areia! - insistiu a velhinha. E já ia tocar a lambreta, quando o fiscal propôs:

- Eu prometo à senhora que deixo a senhora passar. Não dou parte, não apreendo, não conto nada a ninguém, mas a senhora vai me dizer: qual é o contrabando que a senhora está passando por aqui todos os dias?

- O senhor promete que não "espáia"? - quis saber a velhinha.

- Juro - respondeu o fiscal.

- É lambreta.
Stanislaw Ponte Preta








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